segunda-feira, 30 de abril de 2012

Simplesmente Sônia Maria Campos Braga, mulher brasileira


                         Simplesmente Sônia Maria Campos Braga, mulher brasileira.                                                                                           
Ubiracy de Souza Braga*
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* Sociólogo (UFF), Cientista Político (UFRJ), Doutor em Ciências junto à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Professor Associado da Coordenação do curso de Ciências Sociais da Universidade Estadual do Ceará (UECE).




                                                       “Nada grandioso no mundo foi realizado sem paixão” (Hegel). 
                                                                                  


                                                                                                                 
                                                               Foto: Antônio Guerreiro.

Sônia Braga estreou na carreira artística aos 18 anos, na peça teatral Hair (cf. Braga, 2012), da qual foi a grande estrela. No cinema protagonizou importantes filmes, como Dona Flor e Seus Dois Maridos, Eu Te Amo e A Dama do Lotação. No primeiro caso, trata-se de um filme baseado em um dos romances mais conhecidos do escritor brasileiro Jorge Amado, membro da ABL, que o publicou em 1966, em plena ditadura militar castelista (cf. Figueiredo, 1980). Na terceira parte do livro os acontecimentos se “atropelam” e assumem um estilo do “realismo fantástico”, quando o espírito de Vadinho (que era filho de Exu) retorna e passa a atormentar Dona Flor. Somente ela vê Vadinho, que quando está com Dona Flor parece ser capaz de realizar as mesmas coisas que fazia na cama quando estava vivo. Dona Flor hesita em se manter fiel ao novo marido ou ceder ao espírito do primeiro.
            Na mitologia dos orixás Exú pode ser o mais benevolente dos Orixás se é tratado com consideração e generosidade. Os filhos de Exú possuem um caráter ambivalente, ora são pessoas inteligentes e compreensivas com os problemas dos outros, ora são bravas, intrigantes e ficam muito contrariadas. As pessoas de Exú não têm paradeiro, gostam de viagens, de andar na rua, de passear, de jogos e bebidas. Quase sempre estão envolvidas em intrigas e confusões. Guardam rancor com facilidade e não aceitam ser vencidas. Por isso para ter-se um amigo ou filho de Exú é preciso que se tenha muito jeito e compreensão ao tratar-se com ele. A Importância de Exú é fundamental, uma vez que ele possui o privilégio de receber todas as oferendas e obrigações em primeiro lugar, nenhuma obrigação deve ser feita sem primeiro saudar a Exú. É o dono de todas as encruzilhadas e caminhos, é o homem da rua, quem guarda a porta e o portão de nossas casas, quem tranca, destranca e movimenta os mercados, os negócios, etc. Exú também nos confirma tudo no jogo de IFÁ (cf. Prandi, 1991; 1992; 1995a; 1995b; 2001) .
Jorge Leal Amado de Faria (1912-2001) foi um dos mais famosos e traduzidos escritores brasileiros de todos os tempos. Ele é o autor mais adaptado da televisão brasileira, em especial a Rede Globo de Televisão, com verdadeiros sucessos como Tieta do Agreste, Gabriela, Cravo e Canela e Teresa Batista Cansada de Guerra são criações suas, além de Dona Flor e Seus Dois Maridos e Tenda dos Milagres. A obra literária de Jorge Amado conheceu inúmeras adaptações para cinema, teatro e televisão, além de ter sido tema de escolas de samba por quase todo o Brasil. Seus livros foram traduzidos em 55 países, em 49 idiomas, existindo também exemplares em braille e “em fitas gravadas para cegos”. Amado foi superado, em número de vendas, apenas pelo escritor esotérico Paulo Coelho, mas, em seu estilo - o romance ficcional -, não há paralelo no Brasil. Em 1994 viu sua obra ser reconhecida com o Prêmio Camões.
O “Realismo Fantástico” pode receber outros nomes como “Realismo Mágico” ou “Realismo Maravilhoso” e se trata de uma escola literária do século XX. Muitos consideram que o Realismo Fantástico se trata de uma resposta da América Latina e Literatura Fantástica da Europa. O Realismo Fantástico deu origem a diversos romances e contos e as principais características que o estilo emprega são aspectos e fatos mágicos surreais vistos pelos personagens como algo normal e convencional que faz parte do mundo; presença de intuição e previsões pelos personagens como se isso fizesse parte dos sentidos humanos normais; elementos mágicos que aparecem em meio a história e não tem necessariamente uma explicação plausível; noção de tempo distorcida o presente pode se repetir inúmeras vezes; estética que mistura a fantasia com o real; o cotidiano com elementos fantásticos que no contexto fazem parte da história.
Queremos dizer com isto que o mágico está presente na literatura e na realidade latino-americana. A fantasia do escritor, trabalhada por sua linguagem, produz a magia da escritura. O que há de novo, talvez, é que sempre ressoa a realidade na ficção, da mesma forma que esta naquela. Uma povoa a outra. Há acontecimentos, situações, figuras, sombras, ecos, labirintos que aparecem do nada, pela aura da escritura. Há expressões, imagens, metáforas, alegorias no romance que revelam a fantasia do real. Assim como pode ser um traço fundamental de uma época da história da literatura latino-americana. Um estilo literário que revela o espírito da cultura dessa época. E esta altura, por sua vez, ressoa os trabalhos e os dias, os impasses e as lutas, as derrotas e as façanhas da vida das pessoas, famílias, grupos, classes, movimentos sociais e outros setores ou “manifestações de vida” no sentido simmeliano do termo, nas sociedades nacionais, do continente e das ilhas.
Talvez tenham sido os desafios característicos de uma época da história social e política que transformaram a cultura da América Latina em um vasto arsenal de fatos surpreendentes, insólitos, brutais, incríveis, encantados; isto é, “uma profusão de fantasias, maravilhas e barroquismos”. Os impasses e as façanhas de uma época permitem reler o passado e o presente. É como se um novo horizonte iluminasse de repente todo o vasto mural da história, revelando fatos e feitos que adquire outro movimento, som, cor. O romancista pode ser um cronista “fora do tempo”, narrando o imaginado e o acontecido segundo a luz que o ilumina. Nesse sentido ele pode representar “um estilo de olhar” na medida em que o realismo mágico parece uma “superação do realismo social, crítico”. Tem sido visto como um estilo diferente, novo.
Já mencionamos noutro lugar que chamamos de “conceito” o que Platão parece “demonstrar” não como “culto” ao belo, posto que só tivesse validade se correspondesse a uma “essência no mundo das ideias”. Mas a busca platônica pelo belo, o bom e o justo ficam na história do Ocidente para buscar o “belo em si”. Com as grandes religiões, o belo situa-se sempre fora da experiência sensível. Seria o divino aquilo que o humano tem como referência e que tenta alcançar. Para sermos breves, Kant realiza uma virada, dizendo que é impossível ter uma regra universal acerca do belo, pois todo juízo a respeito do belo é singular, determinado pelo gosto; não há mais uma determinação “universalizante”. Ao mesmo tempo, se para Kant, apesar de o gosto ser singular, todo mundo tem faculdades semelhantes; portanto a decisão sobre o que é belo se rompe com a universalização, mas as condições são universalizáveis.


Destarte a estreia de Sonia Braga como atriz ocorreu no teatro, e logo num papel pra lá de polêmico. Pela insistência do produtor, conseguiu, aos 18 anos, um papel com nudez na peça “Hair”. Foi a primeira peça a trazer atores nus para os palcos brasileiros. No cinema, conseguiu sua primeira oportunidade no mesmo ano, no antológico “O Bandido da Luz Vermelha” (1968), de Rogério Sganzerla. Vale lembrar que João Acácio Pereira da Costa, conhecido como “Bandido da Luz Vermelha” (1942-1998), foi um notório criminoso brasileiro. O reconhecimento internacional veio com “O Beijo da Mulher Aranha” (“Kiss of the Spider Woman”, 1985), de Hector Babenco. O filme conta a história do prisioneiro político de esquerda Valentín Arregui (Raul Julia) e Luís Molina (William Hurt), um homossexual afeminado condenado por “corrupção de menor”. Os dois dividem uma cela numa prisão brasileira. Molina relembra, na prisão, um de seus filmes favoritos, um suspense romântico de guerra que também é uma propaganda nazista. Ele tece os personagens do filme numa narrativa que traz conforto a Arregui para distraí-lo da dura realidade da prisão e da separação da mulher que ama. Arregui permite que Molina penetre sua auto-defensiva intimidade e se abre para ele.
Apesar de suas discussões sobre a política por trás do cinema, uma improvável amizade se desenvolve entre os dois prisioneiros: o sonhador e o ativista político. À medida que a história se desenvolve, fica claro que Arregui está sendo envenenado pelos carcereiros para que revele o que sabe. Molina, ao que tudo indica, também pode ter segundas intenções, ou seja, seus sentimentos românticos por Arregui. Produzido em conjunto entre Brasil e Estados Unidos, reuniu ao lado de Sônia Braga os atores William Hurt e Raul Julia. O trio de atores e o diretor ganharam destaque na mídia americana, tendo suas carreiras projetadas. “O Beijo da Mulher Aranha” foi indicado ao Oscar de Melhor Filme, com Sônia sendo indicada ao Globo de Ouro de Melhor Atriz. Atingia, ali, o auge de sua popularidade internacional.
Aproveitando o bom momento de realização profissional, estética e artística, Sônia Braga deixou o Brasil ainda em 1985, logo após a concretização do movimento político Diretas Já de reivindicação por eleições presidenciais diretas no Brasil ocorrido em 1983-1984, indo morar nos Estados Unidos. Lá, artisticamente envolveu-se com os mais diversos tipos de produção, como: “Moon over Parador” (Br/Pt: “Luar sobre Parador”) é um filme estadunidense de 1988, do gênero comédia, dirigido por Paul Mazursky, com roteiro de Leon Capetanos e Paul Mazursky, baseado em história de Charles G. Booth, música de Maurice Jarre e direção de arte do brasileiro Marcos Flaksman. O filme teve locações em Nova Iorque, Ouro Preto, Rio de Janeiro e Salvador. “Rebelião em Milagro” (1988), a morte do presidente/ditador de um país latino-americano faz com o chefe de seu gabinete, Roberto Strausmann, convença o ator Jack Noah, que “é um sósia do morto, a assumir seu lugar”. Desta forma, Strausmann pode governar, usando Noah como fantoche. Porém, a namorada do falecido, Madonna Mendez, ao contrário da população sabe da verdade.
Em “Rookie, um Profissional do Perigo” (1990), de Clint Eastwood. Nick Pulovski (Clint Eastwood) é um policial que está na divisão de roubo de carros e nunca conseguiu realizar um grande feito em sua vida. Quando ele descobre que um homem chamado Strom é o chefe por trás de um grande roubo, ele vê sua grande chance. Como seu parceiro pode ser assassinado durante missão, o caso é transferido para o departamento de homicídios e ele não tem mais acesso aos arquivos. Pulovski ganha um novo parceiro, David Ackerman (Charlie Sheen), e quer continuar em busca de Strom, mesmo não estando mais oficialmente ligado ao caso.
Fez alguns telefilmes incluindo sua participação no seriado “The Bill Cosby Show”. Telefilme é uma película pensada para ser exibida na televisão. Surgiu em meio a grave crise do cinema norte-americano pós-guerra que sofreu esgotamento por causas externas à indústria cultural. Neste mesmo cenário a televisão crescia vertiginosamente. Um dos visionários a levar cinema para TV foi o genial Alfred Hitchcock (cf. Braga, 2008). Na primeira metade dos anos 1990, Sônia Braga percebe que os papéis começavam aparentemente a diminuir. Depois de fazer “A Última Prostituta” (1991) onde um ancião conta aos sobrinhos a história da cortesã Loah Campos, que foi amante de homens poderosos. Ao descobrirem que a mulher vive agora reclusa numa fazenda do Texas, os dois partem para lá e buscam emprego, “a fim de perder a virgindade com uma mulher experiente” e “Amazônia em Chamas” (1994), que narra a história política de Chico Mendes, (Xapuri, 15 de dezembro de 1944 - Xapuri, 22 de dezembro de 1988) um seringueiro, sindicalista e ativista ambiental brasileiro.
O homem condenado por ser o mandante da morte do sindicalista Chico Mendes, o fazendeiro Darly Alves da Silva, afirmou em entrevista concedida pelas lentes do Fantástico (Rede Globo de Televisão) que o seringueiro “não valia nada”. Segundo ele, foi Chico Mendes “quem se matou” porque “mexeu com todo mundo”. Sua atividade política visada à preservação da Floresta Amazônica lhe deu projeção mundial. Neste período, como vimos, Sônia Braga voltou a se dedicar a algumas produções no Brasil. E, logo de cara, retornou às adaptações de Jorge Amado, com “Tieta do Agreste” (1996), de Cacá Diegues. A partir daí, começou a fazer participações especiais em novelas, mas sempre aparecendo hic et nunc em outro filme, tais como: “Cidade do Silêncio”, “Um Amor Jovem” ou nas séries norte-americanas: “CSI: Miami”, “Alias: Codinome Perigo”, “Ghost Whisperer”.
Em “Páginas da Vida”, apelava Sônia Braga aos jornalistas que acompanharam, no Rio de Janeiro, as gravações do último episódio: “Vocês têm que compreender que eu estou sempre fazendo uma novela”. Como toda celebridade, vidrada em fama e holofotes, a atriz não escondeu a cara perante as câmaras e as objetivas. E na festa, que decorreu no Porcão Rio’s, Sônia Braga parecia ser a “estrela da novela”, pela atitude de vedete que revestiu a sua entrada no recinto. O objetivo era mesmo chamar a atenção. Uma mulher sabe chamar atenção. Sorrisos, beijos lançados para os fãs, piscares de olho e um insinuante despir-se do casaco para os fotógrafos, marcaram a entrada da atriz, que demorou mais tempo na “passarela vermelha” do que provavelmente qualquer outro colega. Na novela escrita por Manoel Carlos, conhecido por todos como Maneco e morador da bela praia do Leblon, em exibição na SIC, a pose é a mesma e Sônia Braga “bebe cada cena como se fosse a derradeira”. Como que agradecendo a Deus o fato de, aos 56 anos ter de novo a oportunidade de brilhar no gênero que, na década de 1970, a lançou para a fama na interpretação da doce e sensual “Gabriela”.
Em “Páginas da Vida”, uma novela em meu modo de entender claustrofóbica, Sônia Braga interpreta a escultora Tônia Werneck. Tônia é uma artista plástica sedutora, que vive uma paixão tórrida com um homem mais novo e casado (Edson Celulari) e termina a história nos braços de um galã serôdio (Tarcísio Meira) que, curiosamente, é sogro do primeiro. Na vida real, a atriz também é dada como namoradeira. E por que não? Depois de várias décadas vivendo nos Estados Unidos, onde protagonizou um tórrido romance com Robert Redford, a própria atriz responde à imprensa: “Graças a vocês [jornalistas] eu tive um marido e um namorado. Espero que não me separem agora que acabou a novela”. A imprensa brasileira relata ao pormenor o seu namoro com o ator Sidney Sampaio, 29 anos mais novo. Mas Sônia Braga nega ter uma relação séria: “Isso foi a imprensa que inventou”, disse à Correio TV na festa que se seguiu às gravações da trama escrita por Manoel Carlos, afirmando ainda: “Desde o começo que nós somos amigos. Um dia, num desfile, eu disse que usava uma aliança criada pelo joalheiro Antônio Bernardo e depois dei-lhe uma igual, no Natal, porque ele adora anéis. Foi um presente de amigo”. No entanto, este é apenas mais um dos casos, verdadeiros ou não, que coleciona como qualquer ser humano feliz com as suas realizações em seu campo afetivo e de trabalho.
Vale lembrar, segundo o laureado escritor Jorge Amado, que um livro surge às vezes de um acontecimento, de uma frase, de uma pessoa, assim como ocorreu com Dona Flor e seus dois maridos de l966. O romance é resultado de uma história real ocorrida na década de 1930 na Bahia: “com uma senhora que, quando jovem, casara com um boêmio, jogador e mulherengo, morto logo depois do casamento”. A jovem viúva volta a casar com o honesto comerciante português Teodoro, mas algum tempo depois passa a sonhar com Vadinho, o marido morto, que lhe aparece exigente de amor. Honesta e de uma moral acima de qualquer desvio, “Dona Flor” passa a viver o terrível drama psico-afetivo, para lembramos de Freud, sem saber como resolvê-lo. Na vida real, a viúva eterniza o seu drama ao contá-lo a um amigo de Jorge Amado que na ficção se encarrega de resolver e dar “vida” ao impasse.
Foi com as personagens de Jorge Amado que ela (re) descobriu sua sensualidade como “Gabriela”, “Dona Flor” e “Tieta”. Uma mulher, para lembrarmo-nos de Simone de Beauvoir, “não nasce mulher, torna-se”. Na tranquilidade de Petrópolis, em 1958, escreve “Gabriela, cravo e canela”. O livro, publicado em agosto, esgota 20 mil exemplares em apenas duas semanas; até dezembro venderia mais de 50 mil exemplares. Sai o disco “Canto de amor à Bahia e quatro acalantos de Gabriela, cravo e canela”, trazendo leituras de Jorge Amado e música de Dorival Caymmi. No ano seguinte, “Gabriela” coleciona prêmios: Machado de Assis, do Instituto Nacional do Livro; Jabuti, da Câmara Brasileira do Livro e Luiza Cláudio de Souza, do Pen Club, são alguns deles. O romance ultrapassa a casa dos 100 mil exemplares vendidos. Recebe em Salvador, do Axé Opô Afonjá, como é o caso de Muniz Sodré de Araújo Cabral, autor de uma centena de livros e artigos, entre eles: “O dono do corpo” (1998), “La Città e il Tempi” (1998), “Multiculturalismo” (1999), “Corpo de Mandinga” (2002), “Antropológica do Espelho” (2002) , um dos mais altos títulos do candomblé, o de obá orolu, também receberam tal distinção o compositor Dorival Caymmi e o artista plástico Carybé. “Obá, no sentido primitivo, é um dos doze ministros de Xangô”, explica Jorge Amado. Funda a Academia de Letras de Ilhéus. Lança na revista Senhor, do Rio de Janeiro, a novela “A morte e a morte de Quincas Berro D`água”; a ideia inicial era que este texto, de 98 páginas datilografadas e escrito em dois dias, integrasse o romance “Os pastores da noite”. Naquela mesma publicação sairia o conto: “De como o mulato Porciúncula descarregou o seu defunto”.
Enfim, Sonia Braga se transformou em sinônimo dos principais personagens libertários femininos deste escritor baiano e no símbolo sexual do cinema brasileiro. Com 12 milhões de espectadores, “Dona Flor e Seus Dois Maridos” é recordista de público do cinema brasileiro. Raul Julia foi seu parceiro em quatro filmes. O ator porto-riquenho morreu em 1994 e foi um dos colegas mais especiais da vida de Sonia Braga. Em sua vida amorosa são púbicos seus flertes e namoros com Robert Redford, Clint Eastwood, Caetano Veloso, Warren Beatty, Chico Buarque, Djavan, Pelé, Mick Jagger e Pat Metheny.
Na boutade de Caetano Veloso:
 “Uma tigresa de unhas/Negras e íris cor de mel./Uma mulher, uma beleza/Que me aconteceu./Esfregando a pele de ouro marrom/Do seu corpo contra o meu/Me falou que o mal é bom e o bem cruel./Enquanto os pelos dessa/Deusa tremem ao vento ateu,/Ela me conta, sem certeza,/Tudo o que viveu: Que gostava de política em mil/Novecentos e sessenta e seis/ E hoje dança no Frenetic Dancin? Days./Ela me conta que era atriz/E trabalhou no Hair./Com alguns homens foi feliz,/Com outros foi mulher./Que tem muito ódio no coração,/Que tem dado muito amor,/Espalhado muito prazer e muita dor./Mas ela ao mesmo tempo diz/Que tudo vai mudar,/Porque ela vai ser o que quis/Inventando um lugar/Onde a gente e a natureza feliz,/Vivam sempre em comunhão/E a tigresa possa mais do que o leão./As garras da felina/Me marcaram o coração,/Mas as besteiras de menina/Que ela disse, não./E eu corri pra o violão num lamento/E a manhã nasceu azul./Como é bom poder tocar um instrumento”.
Para Jorge Amado: “os personagens surpreendem muito. Se é vivo, reage, não obedece”, explica o autor para afirmar que no romance o personagem de Dona Flor surpreende Jorge Amado ao sucumbir aos encantos do marido morto que, depois de saciado, vai embora enquanto ela se entrega ao marido real achando que se um é bom, dois é ótimo. O escritor achava que devido a sua moral irretocável Dona Flor não aceitaria os encantos do marido morto, e foi esse o fim que escreveu antes de dormir e sonhar com o outro final em que ela, afinal, cede à tentação. Para o autor, a moral do romance está em que o amor supera a morte: “Se o meu fim prevalecesse, seria a morte que venceria”.
Grande sucesso de público nos anos 1980, Eu Te Amo é “uma fantasia romântica sobre o desejo e a paixão”. Tudo se passa dentro de um apartamento fantástico, como um caleidoscópio ou um palácio de espelhos, onde “os delírios do amor e do sexo se refletem num ritmo alucinante”. É a história de um homem, industrial falido no chamado “milagre econômico” dos anos 1970, e de uma mulher que deseja desesperadamente se amar e que, ao mesmo tempo, têm um medo brutal desse encontro. O filme Eu Te Amo começa como drama psicológico, evolui para a comédia e erotismo e acaba como um grande delírio musical. Mas o que há de fantástic/mágico é que este filme apesar de ter sido rodado em 1981 continua com um reflexo atual, não nos discursos, mas sim nos sentimentos, sentimentos que deveríamos todos ter, o sentimento à flor da pele, a sede de amar e de descobrir um mundo novo atrás do amor. Enfim, A Dama do Lotação é um filme brasileiro de 1978 do gênero drama erótico, dirigido por Neville de Almeida baseado em uma história de Nélson Rodrigues. O filme é “a quarta maior bilheteria da história do cinema brasileiro, com 6 508 182 espectadores”.
Na narrativa de Nelson Rodrigues:
“Às dez horas da noite, debaixo de chuva, Carlinhos foi bater na casa do pai. O velho, que andava com a pressão baixa, ruim de saúde como o diabo, tomou um susto - Você aqui? A essa hora? E ele, desabando na poltrona, com profundíssimo suspiro: - Pois é, meu pai, pois é! - Como vai Solange? - perguntou o dono da casa. Carlinhos ergueu-se; foi até a janela espiar o jardim pelo vidro. Depois voltou e, sentando-se de novo, larga a bomba: - Meu pai, desconfio de minha mulher. Pânico do velho: - De Solange? Mas você está maluco? Que cretinice é essa? O filho riu, amargo: - Antes fosse, meu pai, antes fosse cretinice.  Mas o diabo é que andei sabendo de umas coisas... E ela não é a mesma, mudou muito. Então, o velho, que adorava a nora, que a colocava acima de qualquer dúvida, de qualquer suspeita, teve uma explosão: - Brigo com você! Rompo! Não te dou nem mais um tostão! Patético, abrindo os braços aos céus, trovejou: - Imagine! Duvidar de Solange! O filho já estava na porta, pronto para sair; disse ainda: - Se for verdade o que eu desconfio, meu pai, mato minha mulher! Pela luz que me alumia, eu mato, meu pai!”.
Na televisão, um de seus primeiros trabalhos deu-se na versão brasileira do programa educativo infantil Vila Sésamo (“Sesame Street”), em que interpretava a professora Ana Maria. Vila Sésamo foi uma série de televisão, uma versão brasileira baseada no programa infantil norte-americano “Sesame Street”, criado pela Children’s Television Workshop de Nova York, “baseado em opiniões e conceitos emitidos por técnicos de educação e agência de publicidade”. Mas seus maiores sucessos foram as telenovelas Gabriela e Dancin`Days, sendo esta uma telenovela brasileira, produzida e exibida pela Rede Globo de 10 de julho de 1978 a 27 de janeiro de 1979, às 20 horas. Foi escrita por Gilberto Braga e dirigida por Daniel Filho, Gonzaga Blota, Dênis Carvalho, Marcos Paulo e José Carlos Pieri, tendo contado com 173 capítulos. Júlia de Souza Matos é uma ex-presidiária, que ganha liberdade condicional após onze anos de prisão. Ela foi presa por atropelar acidentalmente, um homem durante a fuga a um assalto a um banco. Após sair da cadeia, onde sofreu muito, ela tenta se reaproximar da filha, Marisa de Souza Matos, tendo como principal obstáculo a irmã.
A partir de 1985, como vimos, foi viver nos Estados Unidos da América onde atuou em filmes e programas de televisão, tendo participado da famosa série norte-americana Sex and the City que é uma série de televisão baseada num livro com o mesmo nome de Candace Bushnell, Scott B. Smith e Michael Crichton. Foi originalmente transmitida nos Estados Unidos da América pela cadeia HBO, de 6 de Junho 1998 até a 2 de Fevereiro de 2004. Passada na cidade de Nova Iorque, a série focava nas relações íntimas de quatro mulheres que eram amigas, três das quais nos trinta, e uma, Samantha, nos seus quarenta. Uma comédia de situação com elementos de telenovela, a série focou muitas vezes assuntos relevantes como o papel da mulher na sociedade contemporânea.
Foi casada com o guitarrista de jazz Pat Metheny. Após vinte anos vivendo no exterior, em 2006, Sônia regressou ao Brasil para participar de uma telenovela inteira, Páginas da Vida, de Manoel Carlos, “onde interpretou uma escultora internacionalmente reconhecida”. É uma telenovela brasileira produzida e exibida pela Rede Globo no horário nobre da emissora, entre 10 de julho de 2006 e 2 de março de 2007, totalizando 203 capítulos. A novela, que substituiu Belíssima, de Sílvio de Abreu, foi escrita por Manoel Carlos com colaboração de Fausto Galvão, Maria Carolina, Leandra Pires, Juliana Peres, Ângela Chaves e Daisy Chaves, dirigida por Jayme Monjardim, Fabrício Mamberti, Teresa Lampreia, Fred Mayrink e Luciano Sabino e com direção de núcleo de Jayme Monjardim. Sua última participação completa fora em 1980, em Chega Mais. Na trama Tom e Gelly vivem uma relação muito difícil. Ela se complica ainda mais quando Tom é sequestrado no dia do seu casamento com Gelly, deixando-a aflita no altar. Na verdade ele planejou o sequestro para a família de Gelly pagar o resgate. Mas o que Tom não sabia é que a família dela composta pelos pais Agda e Belmiro, o irmão Dadá, a tia Lili e a avó Cândida, vivem em uma constante crise financeira.
Depois disso, ela participou dos primeiros quinze capítulos da telenovela dita “de época”: Força de um Desejo, em 1999. No Século XIX, Vale do Paraíba, Rio de Janeiro. Higino Ventura (Paulo Betti) é o ex-mascate que enriqueceu com negócios escusos e que comprou a fazenda Morro Alto, na localidade de Vila de Sant`Anna, para se aproximar de sua antiga paixão, Helena (Sônia Braga), moradora da fazenda vizinha, a Ouro Verde, agora casada com o poderoso Barão Henrique Sobral (Reginaldo Faria). Ele está disposto a tudo para reconquistar Helena, inclusive comprar a Ouro Verde e obter o título de nobreza e o mesmo status do barão. Mas Helena, apesar de amar o marido e desprezar Higino, sofre nas mãos do barão, pois este sabe que Abelardo (Selton Mello), que criou como seu filho, é na verdade filho de Higino.
O cantor e compositor bahiano Caetano Veloso compôs duas canções inspiradas em Sônia Braga, que são Tigresa, sucesso na voz de Gal Costa, e Trem das Cores. Posou para a revista Playboy em setembro de 1984 e julho de 1986. Em 2007 interpretou a personagem Alice Monteiro em Donas de Casa Desesperadas, uma minissérie dramática brasileira produzida pela Rede TV! de 15 de agosto de 2007 à 16 de janeiro de 2008 em 23 episódios. É uma minissérie contemporânea que mistura comédia, o chamado “humor negro” e drama. No enredo, o cotidiano de mulheres que aparentemente possuem uma vida perfeita, mas na verdade, estão “à beira de um ataque de nervos”, para lembramos de Pedro Almodóvar, sendo contemplado na versão brasileira de Desperate Housewives.
Nos anos 1970 e 1980, as mulheres mais bonitas do Brasil foram fotografas pelas lentes do fotógrafo Antônio Guerreiro (cf. Braga, 2012), o preferido de nove entre dez celebridades. Fernanda Montenegro, Leila Diniz, Vera Fischer, Lucélia Santos, Tônia Carrero, Zezé Motta, Sandra Bréa, Dina Sfat, Priscila Fantin, Betty Faria e muitas outras, nenhuma mulher famosa escapou aos olhos e à câmera do artista. Dentre tantas beldades, duas estrelas eram as musas preferidas de Antonio Guerreiro: a atriz Sonia Braga, com quem viveu um romance, e a cantora Gal Costa. Estas duas mulheres que têm vários pontos comuns entre si, como a sensualidade e a beleza quente que retrata a mulher brasileira, além das personagens para as quais Sonia Braga emprestou o corpo, e Gal Costa a voz; foram registradas no esplendor da juventude por Antônio Guerreiro.
            As imagens capturadas pelo fotógrafo Antônio Guerreiro ao longo de sua carreira e em momentos em que se construía parte da nossa história, na imprensa, na música, no teatro e na televisão, o coloca como um nome que deve ser respeitado e lembrado por pesquisadores e estudantes. Seu arquivo fotográfico é de fundamental importância para a compreensão da construção cultural do Brasil. Guerreiro conseguiu, durante muitos anos, registrar aspectos interessantes da história do país em plena época da ditadura. Ele registrou, por exemplo, todo o glamour da fama nas décadas de 1970 e 1980, em especial o universo feminino, onde também viveu seus amores. Foi casado com Sônia Braga, e, com a inesquecível Sandra Bréa, considerada símbolo sexual do país na década de 1970 e na década de 1980, além de ter namorado uma lista invejável de mulheres.
Bibliografia geral consultada:
FIGUEIREDO, Eurico de Lima, Os Militares e a Democracia. Rio de Janeiro: Editora Graal, 1980; PRANDI, Reginaldo, “Catolicismo e família: transformações de ideologia”. In: Cadernos CEBRAP. São Paulo (21), 1974; Idem, Os candomblés de São Paulo: A velha magia na metrópole. São Paulo: Hucitec/EDUSP, 1991; Idem, “Perto da magia, longe da política”. In: Novos Estudos CEBRAP. São Paulo, n° 34, novembro de 1992; Idem, “Dei africani nell’ odierno Brasile: Introduzzione sociologica al candomblé”. In: Luisa Faldini Pizzorno (org.), Solto le acque abissali. Firenze: Aracne, 1995a; Idem,  “Raça e Religião”. In: Novos Estudos CEBRAP, n° 42, julho de 1995b; Idem, Mitologia dos Orixás. São Paulo: Companhia das Letras, 2001; SODRÉ, Muniz, Corpo de Mandinga. Manati, 2002; Idem, Antropológica do Espelho. Petrópolis (RJ): Vozes, 2002; Idem, Multiculturalismo. Rio de Janeiro: DP&A, 1999; Idem, Claros e Escuros. Rio de Janeiro: Vozes, 1999; Idem, Samba - O dono do corpo. Rio de Janeiro: Mauad, 1998; Idem, Reinventando la Cultura. Barcelona: Gedisa, 1998; Idem, La Città e il Tempi. Roma: Settimo Sigillo, 1998; RODRIGUES, Nelson, Cem contos escolhidos - A vida como ela é..., Rio de Janeiro: J. Ozon Editor, 1961, 2 volumes; Idem, Elas gostam de apanhar. Rio de Janeiro: Bloch Editores, 1974; Idem, A vida como ela é - O homem fiel e outros contos. Seleção Ruy Castro. São Paulo: Companhia das Letras, 1992; Idem, A dama do lotação e outros contos e crônicas. São Paulo: Companhia das Letras, 1992; Idem, Flor de Obsessão. São Paulo: Companhia das Letras, 1997; AMADO, Jorge, Bahia de tous les saints. Paris: Éditions Gallimard, 1979; BRAGA, Ubiracy de Souza, “Fabulas de Solidariedade: Neruda, Kurosawa e Hitchcock”. In: http://dapraianet.blogspot.com/2008. Max Krichanã Editor, 4.02.2008; Idem, “Lugar de mulher é nas histórias de ação no cinema”. Disponível em: http://www.oreconcavo.com.br/2011/07/15; Idem, “Hair: A estetização da política no contexto norte-americano, 1959-75”. Disponível em: http://cienciasocialceara.blogspot.com.br/; ALBERONI, Francesco, O Erotismo, Fantasias e Realidades do Amor e da Sedução. São Paulo: Circulo do Livro, 1986; FERNANDES, Florestan, Nova República? Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1986; Idem, “Ciências Sociais: na ótica do intelectual militante”. In: Revista Estudos Avançados. São Paulo: IEA - Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo. Volume 8 - Número 22, Setembro/Dezembro, 1994; RIBEIRO, Darcy, O Povo Brasileiro: A formação e o sentido do Brasil. 2ª edição. São Paulo: Companhia das Letras, 1995; DREIFUSS, René Armand, O Jogo da Direita Na Nova República. Petrópolis (RJ): Editora Vozes, 1989, entre outros.


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